domingo, 24 de março de 2013

Relato de experiencia vivida I


Eu estou doente. Creio que por causa do cansaço físico por conta dos quinze dias de trabalho na cozinha da paróquia, isto é normal. Este cansaço é muito prazeroso e agradável. Mas, o cansaço psicológico, oriundo das coisas que passei por lá muito me machucaram e deixaram um resquício de dores e doenças...
Não é à toa que se abandona a nossa casa por duas semanas. Eu abandonei a minha por um trabalho que sinto que é muito gratificante sob muitos e diferentes aspectos: aprendizagem, convívio com pessoas, financeiro e doação.
Esses são quatro poderosos motivos que me fazem sair da minha casa e enfrentar um trabalho de quinze dias na cozinha da paróquia. Sigo um lema que diz: devo me experimentar fazendo. Nada de viver a vida a margem. Nada de viver a vida através da tela fria de um computador. Viver mesmo de verdade. Ter experiências para poder relatar aos filhos e aos netos e se estes não quiserem ouvir escreve-se e deixa-se um legado.
Nestes quinze dias colhi muitos bons e maravilhosos frutos. Um grande aprendizado foi um deles. Aprendizado no mundo da arte culinária e aprendizado no campo humano também.
Eu sou mãe de um dos integrantes da Diretoria da paróquia. Quero dizer que estou na cozinha porque quero, pois lá é a “minha praia”. Faço jus a minha formação. Sou bacharel em Turismo. A Gastronomia é uma ramificação do Turismo. Além disso, possuo um curso de Higiene e Vigilância Sanitária dos Alimentos. Sou mãe e dona de casa há quase 30 anos. Gosto de lidar com a gastronomia. Nunca ninguém passou mal ao comer a minha comida. Portanto, acredito estar no lugar certo.
Eu não me sentiria a vontade em outro cargo, no momento, que não fosse a cozinha. Contudo, senti através dos olhares das pessoas um grande questionamento dentro delas: o que a mãe do Diego está fazendo aqui? A mídia fala a todo o momento de Bulling, e eu senti isso na pele.
Ano passado, eu trabalhei na mesma paróquia, na mesma cozinha. Vivia me escondendo. Não queria que algumas pessoas soubessem que eu ia cozinhar de carro. Na realidade, eu já temia algum tipo de represália. A meu ver isto podia partir das minhas próprias colegas cozinheiras. Este ano já não foi possível esconder o carro. Este ano eu fui muito mal tratada por lá. De certo modo tudo aquilo que eu temia aconteceu.
Não estou conseguindo organizar as minhas ideias para contar fatos encadeados ou pelo menos contar um único fato. O fato é que eu ainda estou muito dolorida com tudo que aconteceu.
Mas vamos lá, primeiro: ano passado o povo da comunidade não sabia que as cozinheiras eram remuneradas pela paróquia pelos seus serviços prestados. Imaginavam, talvez, que era trabalho voluntário. Decorreu-se um ano, as noticias voam, o povo do bairro descobriu que as cozinheiras eram contratadas. A partir de então, começaram a me olhar atravessado. Com aquela cara de que “ela não precisa”, alias, eu preciso sim, entretanto, eles não sabem de que forma preciso.
Tenho certeza que muitos ali queriam estar no meu lugar, só que muitas vezes querer não é poder. O serviço é muito pesado. Mas para mim é gostoso. Queria ver dondoca no meu lugar. Sempre que estou num posto de trabalho alio isso à espiritualidade. Todas às vezes, peço luz ao Divino Espírito Santo para não me abandonar e sempre estar comigo em todos os trabalhos que empreendo e na cozinha da paróquia não foi diferente.
Éramos três cozinheiras, todas três trabalhamos os quinze dias, foi um contrato que fizemos entre nós, mesmo nos dias de nossas folgas íamos para lá. Nesse momento aproveitei para me doar um pouco. Estive por lá em todas as minhas folgas exceto no dia 17 de março que tive aula de minha pós-graduação. Éramos uma equipe integrada, interessada e empenhada em realizar o nosso melhor a fim de que desse tudo certo e com sucesso.
Sei que o meu pensamento acerca de todo o trabalho era o mesmo de minhas colegas cozinheiras: Lourdes e Márcia. Digo isso, porque as meninas não possuem a formação que eu tenho, porém, nosso modo de proceder é o mesmo, elas são excelentes profissionais. Comungamos dos mesmos pensamentos no que diz respeito à segurança, higiene e preparo dos alimentos, por isso somos uma equipe integrada.
Como nada é perfeito e o povo da oposição queria nos desestruturar começaram a nos chamar atenção por isto ou aquilo: um dia era mingau salgado, outro dia era mingau ralo, outro dia não sabiam usar o recheau, outro dia me procuraram para perguntar se eu ainda ia fazer Fricassé de Frango durante a festividade porque simplesmente não sabiam servir, estavam com dificuldade e eu que tinha culpa porque eu inventei esse prato lá. Respondi que eu recebia ordens e se a diretoria quisesse fazer outra vez eu faria com prazer. O fricassé foi um sucesso.
Nossos patrões chegaram até a gente (Diego é um deles) e disseram para não levarmos em considerações críticas que não fossem as deles. Qualquer reclamação ou mudanças somente através deles. Não deveríamos ouvir mais ninguém. E nem dar satisfações a ninguém.
Chegou um momento que todos estavam muito cansados, isto era a olhos vistos, a gente na cozinha, os coordenadores, as pessoas da comunidade que faziam seus trabalhos doados, os ânimos também eram os melhores... O estresse era visível em todos. E assim, numa bela tarde a boquinha da noite uma moça que costuma a ajudar a comunidade, amiga íntima do Diego, entrou na cozinha fazendo reclamação de uma torta de atum que fora servida no dia anterior.
Poxa, toda a minha educação, toda a minha ética, foi por águas a baixo. Não, não fiz nenhuma grossura, muito pelo contrário, contrariei uma regra que dizia que não devíamos dar satisfações para terceiros, satisfações somente para os dirigentes. A amiga do Diego é uma moça muito chegada a nossa casa gosto dela de graça, por conta disso, dei a ela a satisfação que não devia dar.
No decorrer de todo o nosso trabalho na cozinha falávamos muitas brincadeiras, relatávamos casos, falávamos de nossos problemas e angústias, desesperos e muitos outros assuntos. Sentia-me a vontade para abordar certos assuntos porque conheço a Lourdes há 30 anos e a Márcia conheci ano passado por época da festividade. Acabei relatando, mesmo em tom de brincadeira algumas particularidades de minha vida.
Uma noite, já passavam das 23 horas recebi um telefonema da Márcia, que me falou de muitas coisas: espiritualidade, Oração da Serenidade, entrega de trabalhos para Deus, confesso que era um papo muito normal e saudável... Porém, lá pelo meio da conversa ela citou uma frase que ecoa em minha mente até agora, é como se eu lembrasse somente dessa frase. Ninguém tem o direito de falar assim com o outro. Eu não me vejo falando assim para ninguém, nem para um amigo intimo... Eis a frase: “amiga, tu não vive, vegeta”...
A partir de então não ouvi mais nada ao telefone. Falei alguns monossílabos, engoli em seco, mantive a porra da ética, dei uma desculpa e desliguei o telefone. Contudo, no dia seguinte estava firme e forte na cozinha para mais um dia de labuta. Não houve conversa acerca do telefonema da noite anterior, mas, confesso que trabalhei muito pesada, parecia que aquilo era para me desestruturar. Tudo correu bem naquele dia. Amém.
Fazíamos a comida para almoçarmos e também para os nossos patrões, Diego sempre estava presente e isto me enchia de alegria, pois em 2013 eu ainda não tinha tido o privilégio de almoçar com o meu filho. Entretanto, a minha alegria era contida, não sou afoita, sou muito segura de minhas emoções. Eu estava ali a trabalho. Era uma cozinheira como outra qualquer. Não deveria extrapolar e nem ter ataques de “chiliquitos” do tipo “não me toques que me desafinas”. Portanto, minha relação com Diego era normal. Não era melosa.
Num certo tempo, isto incomodou a Márcia. E num dado momento ela se sentiu no direito de dizer que eu era uma mãe muito distante de meu filho. Claro que não parou por ai. Estou procurando belas palavras para colocar a coisa de forma suave. Eu e minha ex-vizinha Lourdes ainda ponderamos que essa “Frieza” partia do próprio Diego por ele ser parecido com o pai dele.
Ainda citei o nome de minha mãe, dizendo que os meninos se parecem com ela, não são melosos. E que se dependesse de mim eu seria muito melosa sim. Mas, ela estava ferrenha com seu argumento que acredito ser mais uma vez para me desestruturar. Então, eu disse algo muito feio, do qual por vezes me arrependo, mas disse: “nenhuma mãe pode questionar o relacionamento de outra mãe com seus filhos, eu pelo menos tive quatro filhos, dei a mesma educação a todos e nenhum é bandido ou marginal”. Não precisa nem dizer que “caguei o pau”...Foi um “chá de cala boca”...
Infelizmente, com tais palavras também magoei minha ex-vizinha Lourdes. Não queria fazer isso. Está doendo até agora...
Teve outra vez que a Márcia disse que eu era “teleguiada” pela minha filha menor... Claro que temos que conversar com nossos filhos mesmo que não façamos aquilo que eles querem... A base de tudo é a família e ninguém se atreva a me colocar contra a minha.
Eu já estava esmorecida, contando os dias para que o trabalho acabasse só estava engolindo em seco em nome da ética. Comecei a prestar atenção que pelo menos nós três pensávamos igual em relação a querer bem o sucesso da festividade e imbuída desse espírito levei até o final.
Senti que apesar de tudo a mais prejudicada era eu, tudo que ocorreu somente aborreceu a mim. Entretanto, voltando para o episódio da Torta de Atum... Da amiga do Diego que veio fazer reclamações... Lembram leitores?
Eu não sei o que deu em mim. Desde o primeiro momento eu soube que errei, porém, hoje com mais clareza, acredito que errei por conta de estar envenenada pelas picuinhas de cunho pessoal que ouvi durante aquele tempo.
Simplesmente, além de dar satisfações acerca da torta de atum a uma pessoa que não era nossa superiora, ainda disse que a receita não era minha e sim da Márcia. Aos olhos vistos que essa atitude era para “tirar o meu da reta”. Não, não fiz de propósito. Aliás, essa era a verdade que não deveria ser dita. Afinal éramos uma equipe, um por todos, todos por um. Errei. Pedi desculpas. Quebrou-se um elo. Senti que nunca mais foi a mesma coisa. Volto a dizer, hoje vejo que foi o veneno engolido aos poucos que me fez agir assim...
Agradeço primeiramente a Deus a oportunidade de empreender este trabalho, agradeço o que aprendi com as minhas colegas da cozinha, pelos momentos em que rimos, comemos e trabalhamos juntas, foram quinze dias inesquecíveis tanto do ponto de vista positivo, como do ponto de vista negativo.
Este final de semana relaxei, coloquei para fora tudo o que engoli, meu corpo estava doendo moído como carne pisada, respiração ofegante e soluços reflexo de tudo aquilo que não chorei, mas senti vontade.Eram dores horríveis na altura do cóccix. Escrevi este texto porque quero lembrar eternamente, quero que algumas pessoas leiam...
Engraçado, estou feliz, fui visitar a Ruth e pela primeira vez ela ficou do meu lado rsrsr... Saí de lá mais inteira...
Um texto publicado neste blog anterior a este foi prenuncio deste e foi manuscrito num dia em que sai da cozinha e fiquei rabiscando numa das mesas lá na festividade tomando uma geladinha...













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